9 de abril de 2007

A Paz


Pedido me foi um poema em palavra grande
(o calor dilata os corpos)
quatrocentas e cinquenta e seis sílabas
de carne com o teu lúcido perfil dentro,
envoltos os cabelos no amarelo lenço
de angolana,
e a fugaz alegria da libélula, mais a leveza do luar sobre o rio

Quem soubesse da palavra sábia,
a retirasse do silêncio, das sombras,
da muda evidência a erguesse
ao agudo espanto das bocas,
e respondesse ao anúncio dos jornais.

Que fosse um forte de voz meiga,
elaborado entre as dúvidas tépidas
que habitam as margens planas.

nas planícies,
a fenda dos olhos quase aberta,
no decurso das esperas se espraia o olhar

sobre a leve linha irreal de azuis
no horizonte separando as humidades, limos,
a líquida substância em maré viva
sobre a praia.

Surgida a fonte, brotando das areias a torrente,
vertendo entre os lábios tremores de aéreos fonemas,
também inapelável o sonho
e a lente subida à intangível esfera.

desenrolo sobre os dedos
nessas formas e forças libertadas
chegadas nos sopros dos traços,
escritas de abraços lentos e espaços,
ouvindo piano e viola,

neste lugar me ponho inteiro
em imagens soltas, etéreas
ou fixas em pedra, queimadas em ácido,
nas forjas vibrantes da incerteza.

desenvolva-se o cansaço,
de sorriso se envolva,
na música de todos os rios, ao crepúsculo,

com breves e calmos sons no interior
das pálpebras descendo às gengivas,
cobrindo os dentes, deixando na língua,
salgado, o sabor de acordar ao teu lado,

o poema da tua boca, o brando gume
do sabor das palavras e silêncios
fio de prata em arco branco,
anel de poeta, lento barco.

deixai fluir os líquidos,
chamai a paz, o amor,
influidos laivos perenes.