18 de fevereiro de 2019

Reserva



Nestes desalmados tempos
em que as mães não mais ensinam
a canção de Inanna a suas filhas,
em que os pais não mais ensinam seus filhos
a merecer a mão e o mel de suas noivas;

Nestes tempos em que esquecidos
ficaram os caminhos desde o Eufrates,
as obras dos velhos babilónios,
o sentido dos caminhantes,
e da sublimação, sob as areias;

Nestes desalmados tempos
de feiura e desencanto;
de ávida escravidão tecnológica,
de mentes errantes, sem âncoras 
e de corações arrefecidos, comatosos;

Perdidos entre novos zigurates,
nas desalmadas ruas das metrópoles;
nos resta sobreviver, sem redenção,
desalmados contra desalmados,
consumidos até à exaustão,
até a uma derradeira extinção. 


Como os dos tempos primeiros,
se recordarmos as doces palavras,
(porque tudo é poema, meu amor)
o sabor do mel nos nossos lábios...

Pois ainda que contagiado pela tristeza,
reservo mão cálida e romântica
para se unir à tua,
para nos unirmos.

30 de janeiro de 2019

retorno...

Retorno ao teu solene semblante,

à imagem da tua face determinada e triste,
registada naqueles fratricidas tempos,
talvez depois de teres estado naquela morgue de Luanda...

Talvez então fosse o teu pensamento levado para a tristeza,
aproveitando o luto que caiu sobre o teu coração de menina...

Talvez então o choque dos cadáveres empilhados
te tenha deixado em petrificação,
ganhando aparência de serenidade...

Da tua doçura juvenil ficaram teus olhos
castanhos num olhar parado,
que um olhar de admirador fixou...

Pela minha paixão por esse teu rosto,
ao Alto Bimbe subi, para resgatar teu coração...
De lá trouxe a eterna e triste paixão,
mas o teu coração não...
 
A esse semblante
sempre retorno,
sempre para chorar,
para lavar minha alma dorida...